O meu livro garrafa

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Não respondas

Não são perguntas que peçam uma resposta, são divagações, pensamentos transbordantes de mim. É tanto o que me corre por dentro, que não cabendo mais, extravasa e me sai pelos dedos, invariavelmente mais vezes, que aquelas que me sai pela boca.
Não que seja por medo, mas não articulo verbalmente com a mesma segurança que quando o faço escrevendo. Escrevendo não sou interrompida no raciocínio lógico, ou nem por isso. Não se baralham as conversas, como nos acontece quando, a horas tardias só nossas, começamos inúmeras e terminamos muito poucas. Depois ficam sempre conversas por conversar, conversas que não são menos importantes só pelo facto de serem banais. Não há banalidade em nós, tudo faz parte, tudo é necessário, e até a desconversa que nos faz rebentar em gargalhadas.
Não te pergunto, permito-me ir esclarecendo receios ao mesmo tempo que os tento ultrapassar, faço os meus filmes, sempre fui uma grande argumentista da minha história, hoje, mais madura e menos novelista, porém, ainda incorro no erro de sofrer por antecipação, até que o meu pequeno lado racional ergue mais alto a sua voz e capta a minha atenção - respiro, revejo, reformulo e reescrevo. São baldes cheios de papel virtual amarrotado e são pequenas histórias definitivas que se podem ler no papel. Nelas, e mesmo nas tristes, procuro sempre olhar o lado positivo, e nos momentos mais sóbrios das minhas emoções, eu consigo acreditar, e continuar a acreditar.
Acredito essencialmente nas pessoas, digo-o sempre. É meu dever acreditar pela firme convicção de que sou uma pessoa de confiança e espero a mesma atitude para comigo. Tenho para mim, que se me enganar, não fui eu quem errou, mas quem não foi digno da minha confiança... e sigo... eu sigo sempre!
Cometo erros, muitos, tenho defeitos também, mas tenho orgulho na capacidade de fazer o mea culpa, liberta-me.

Não respondas...

Não sei falar muito de mim, mas sei mostrar quem sou, o que sinto e o que quero, já percebeste?

Não respondas...


domingo, 20 de julho de 2014

Carta ao tempo

Caro tempo... dá-me tempo, é o que tenho para, humildemente, te pedir.
Não tenho qualquer intenção de ser dona de ti, de mandar em ti, de te domar. Peço-te apenas que dentro dos teus avanços e recuos, dos teus passos mais lentos ou apressados, me dês o tempo necessário.
Sabes, quando temos tempo, não temos pressa, e quando não temos pressa, há tempo para tudo!
Por isso eu só quero o tempo certo para poder viver intensamente os momentos presentes, e felizes, o tempo certo de tudo evoluir naturalmente, e o tempo necessário para ir assimilando essa evolução. Tempo para crescer interiormente, e ver crescer os meus.
Não tenhas pressa para nada, nem sequer para me sentires segura, porque nos passos que avanço a medo, recebo os sinais que me permitem ir sustentando a esperança, e assim, também a segurança a seu tempo se instalará. 
Eu dou o meu tempo ao tempo, para que magicamente transforme as esperas em danças intemporais que me transportam para momentos de puro prazer. Dá-me tempo também, para conquistar o meu espaço sem ser intrusiva, para ir ganhando terreno, sem nada impor. Sou todo um tempo de sorrisos e gargalhadas partilhadas, numa espécie de ritual de conquista. 
Caro tempo, só não tenho, nem quero, tempo para não ser feliz!



quarta-feira, 16 de julho de 2014

Segredo

Venho contar-te um segredo. 

Quando se aproximam as noites que tanto temo, e chega a hora em que tenho de fechar os meus olhos ao Mundo, não me contenho. É nessas alturas que deixo que as lágrimas expurguem tudo o que vai cá dentro. Tudo o que a água do duche não foi capaz de fazer desaparecer pelo ralo. E quando finalmente as lágrimas embalam o meu sono para outra dimensão, eu reinvento os meus sonhos por concretizar, eu perdoo quem me magoou, mesmo sem saber, e perdoo-me a mim própria por alguns julgamentos fáceis em que incorri, movida pela pressão desta sociedade manipuladora da qual procuro fazer parte, sim, mas à minha maneira e tentanto não me deixar apenas levar na corrente. 

E venho aqui ter contigo, e aqui te encontro sempre. E aqui continuo a agradecer todos os dias por te ter conhecido. Tu não entendes muita coisa, mas eu também não sei explicar melhor. Sei que me entrego na plenitude do meu Ser, mas isso nunca parece ser o suficiente, mas não me arrependo. Onde estou só sei estar inteira. Tu ouves-me, e eu sinto-me bem. Depois passa, e eu sinto-me perdida. Vagueio pelos corredores da minha solidão como se esta pudesse ter um fim, mas percebo sempre que por muito que os meus passos acelerem, por muito que pareça estar a alcançar o fim, afinal era só e apenas mais uma curva no caminho. não desisto, porém... 

Quando penso que acordo, vejo-me menina, de olhar cheio de Esperança e Amor, encarando o Mundo da minha janela aberta e vendo sempre algo de bom, mesmo quando aparentemente nada era bom de facto. Quero de volta essa ingenuidade que a vida adulta tenta roubar-me... 

Afinal não tinha acordado, tinha apenas passado a uma outra dimensão de um mesmo sonho. Neste se misturam imagens difusas de uma menina, acho que sou eu mesma, correndo num labirinto de encruzilhadas, primeiro com um sorriso estampado no rosto e uma alegria imensamente infantil, mas depois, subitamente, deixando-se tomar por uma expressão facial de angústia, medo e dor, motivada pelas tomadas de decisão a que era obrigada cada vez que o caminho se desmultiplicava em mil direcções. 

Acordei, agora sei que acordei, em sobressalto, com mil cavalos no lugar em que eu julgava devia estar o meu coração, batendo a compasso. Subi apressada às águas furtadas como se à minha espera estivesses tu, para que eu pudesse apaziguar a minha alma com o meu olhar. Lá estavas tu, sentado , encarando a lua cheia numa noite morna. Aproximei-me de ti, e inexplicavelmente tomei o teu lugar, tornando-me tu próprio em mim. Diz a ciência que dois corpos não ocupam o mesmo espaço, mas eu não sou de ciências, sou de letras. Como tal eu digo, dois corpos podem ocupar o espaço de uma única Alma. 

Onde quer que estejas eu estou contigo... e esse é o segredo!

[Abril 2011]

sexta-feira, 11 de julho de 2014

Revisitar

É com alegria que percebo que posso revisitar os meus lugares, as minhas pessoas, as minhas memórias, as minhas dores, as minhas alegrias, sem o peso da culpa, do remorso ou do ressentimento.
É de sorriso nos lábios que folheio os antigos álbuns de fotos que organizei ao longo dos anos, do tempo que as fotos eram em papel e antes de me render à modernidade. Deles consta muita gente que fez parte da minha vida. Alguns ainda fazem, outros inevitavelmente já partiram desta vida e outros ainda apenas partiram da minha vida (ou eu, da deles). 
Voltam os momentos na sua genuinidade, ainda que, em momentos maus tenhamos tendência para questionar da autenticidade, opto, assumo a minha escolha, por revê-los com o olhar da verdade. E é por isso que não guardo sequer arrependimentos dos erros, dos desencontros, da falta de capacidade de alguns em respeitar a unicidade de cada um de nós e da falta de capacidade de outros em assumirem as suas escolhas. Da minha própria falta de capacidade para entender certas atitudes que aprisionam, que condicionam e que tendem a transformar coisas bonitas, em farsas.
E sou grata, por todas as aprendizagens que me proporcionaram, pelas dores que deliberadamente, ou não, me infligiram, pelos prazeres e alegrias que me ofereceram, pelas sinergias que partilhámos, e só tenho pena das palavras que hoje já não trocamos. 
Traço um percurso de vida em montanha russa pelo assumido papel de viver sempre intensamente as minhas emoções! Não o lastimo, apesar de nem sempre ser fácil. 
E guardo todas as pessoas que se cruzaram comigo e até aquelas que não souberam merecer a minha entrega, ou a minha amizade.
Hoje foi dia de revisitar momentos arquivados, alguns difíceis, outros ligeiros... e uns e outros me deixaram de coração e alma cheios... mas talvez apenas porque me sinto feliz, e a felicidade põe tudo o mais em perspectiva...

quinta-feira, 3 de julho de 2014

Uma página em branco

Continuo aqui, enfrentando esta folha de papel em branco, apurando os meus sentidos para lhe sentir o toque macio e o cheiro quente. A caneta parece não me ser de serventia, parada na minha mão, e o meu pulso parece não se querer mexer, naquele movimento frenético do costume, quando inspirada, desenrolo as palavras e as derramo no papel. Gosto de desenhar cada letra na minha peculiar caligrafia, observando a forma mágica como as palavras se vão formando originando, tantas vezes, sentimentos avessos e até desconhecidos. Gosto do cheiro da tinta permanente, afirmativa, cheia de personalidade, que marcará de forma indelével aquela folha de papel que já foi em branco e agora já não o é mais.
Assim somos nós, como uma folha em branco a cada novo capítulo. Não vale a pena sequer tentarmos arrancar as folhas que albergam as passagens que menos nos agradam, do livro da nossa vida. Todos esses parágrafos terminam num ponto final, no pressuposto, mais que justo, de que todo o fim implica um novo começo. E em cada novo começo, uma nova página em branco.
Neste livro que faz prova provada da nossa passagem pela Vida, muitas vezes não somos nós quem escreve, mas tantas vezes somos só nós quem lê… Somos também como que um livro de visitas, que tanta gente que passa vai assinando, ou como um livro de autógrafos, onde recebemos as palavras que outros nos querem oferecer e dessa forma nos vamos fazendo gente, nos vamos deixando crescer em liberdade de sermos, não só nós, mas todos aqueles que de uma forma ou outra fazem parte da nossa vida, nos escolheram ou por nós foram escolhidos.
Nos momentos mais positivos, atrevo-me a retirar determinados capítulos mais difíceis da prateleira,  folheando cuidadosa e demoradamente cada página, tentando entender algo de novo que no calor da situação e na cegueira da emoção tenha deixado escapar. Estes capítulos são apenas para ser remexidos quando sentimos dentro de nós a força e coragem suficientes e saberemos que as feridas, se as houver, estarão saradas no dia em que as lágrimas deixarem de rolar a cada leitura, ou isso, ou então secámos definitivamente e perdemos a capacidade de sofrer. Tenho medo! Mais ainda de perder a capacidade de amar…
(...)
Era Verão, participava de uma fuga lenta a um amor que não lhe estava destinado, quase que estava já convencida de que tinha virado a página, já não perdia a respiração quando o via, já não tremia quando lhe falava e tudo estava dentro dela mais pacífico desde que a sua determinação, que ainda hoje não sabe bem onde a foi buscar, a fez ter a coragem de assumir de que estava na hora de encerrar aquele capítulo. Um capítulo escrito de rosas vermelhas, símbolo do amor, e dos espinhos dessas mesmas rosas, inundado de lágrimas salgadas e de melodias que lhe conferem, ao capítulo, um especial “quê” no livro da Vida.
Já sorria, os dias já não se arrastavam, o Sol já brilhava de novo dentro de si, e ali estava ela perante nova folha de papel em branco, sentia que de novo o Amor a podia conquistar, estava disponível para que isso pudesse acontecer, sentiu-se de novo tremer, sentiu de novo que a respiração lhe falhava e que o chão não estava mais no lugar. Porém, cedo se revelou de que afinal, a folha não estava em branco… como que de repente surgiram páginas e páginas seguidas de uma história que já havia sido escrita. Surgiram do nada sem que ela pudesse fazê-las parar. Queria deter a crueldade daquelas palavras, queria apagar o sentido daquela história, mas estava escrita a tinta permanente, e ela sabia de que nada adiantava arrancar as folhas, pois também permanentemente ficaria inscrita no livro da sua vida. Por momentos, longos momentos, perdeu a noção de si, quem era afinal, de que era feita, o que a movia!?
Porquê!?
Tomou então as rédeas da escrita, e no meio da folha vazia, cheia de branco, macia, cheirando ainda a virgem, derramou a palavra que a seguir se dita:

FIM!

[Janeiro de 2011]